Cronologia intemporal para Jorge dos Anjos
João Diniz
7 de fev. de 2012
Texto de João Diniz para catálogo de exposição do artista Jorge dos Anjos
As ladeiras ouropretanas em muito contribuíram
para uma cultura de minerais, conspirações e nevoas
numa geografia de conquistas, descobertas e invenções.
um novo Brasil passa a ser recriado em seu interior,
por mãos de barro e sonho que buscam ouro,
voltando olhos para o solo rubro de metais
e propondo novas identidades, patrimônios, fazeres.
essa historia é escrita por múltiplas peles e linguagens,
quando a caravela lusa, retida na costa, vê nas montanhas
a aventura humana na constelação de sonhos e pretensões,
e é lida num texto de sangue, com passos de liberdade e luta,
num novelo político que propõe, no pote diverso das raças,
o mosaico nacional de uma utópica e impossível certeza.
o menino pisa capistranas atento às torres e montanhas,
olho no chão e céus, estrelas aterrizadas em buscas,
e nas explorações do lápis, pincel, giz, tela, carvão e papel,
investigando a nova negritude policromática dos materiais
em diálogos com os mestres do passado e atuais amigos.
Jorge dos Anjos, em seu próprio projeto, nasce diariamente,
na pessoa que expande a biologia experimental da arte
e migra das suas natais serras barrocas, numa fé móvel,
aos horizontes metropolitanos, aos embelezáveis desafios,
e empreende seu vôo de luz e sombra, de aço e fogo.
e sonha em pedra sabão e óleos, em chapas e madeiras,
em tecido, feltros, borrachas, e flores recortadas em cor,
também em cubos, planos, cortes, espaços, dobras e vãos,
numa tensão solta, entre a descoberta e a invenção,
na fronteira da criação e do labor, do silencio e do riso.
na caminhada rítmica do tempo, sem repouso cessante,
segue Jorge sua saga artística, incansável investimento,
em dinâmico calendário, ausente de promessas doces,
e que vai percorrer os dias em guindastes e levitações,
e proposições, projetos, linhas, letras e protótipos,
em recortes e geometrias das recém nascidas matemáticas.
este ciclo de esferas e anéis, pontas e pontos sem fim,
são viagens que partem de Áfricas refazendo o percurso
entre a América e o mundo e que desembarca riscos
em terras de Espanhas, Holandas, Bélgicas e Franças,
e até em rios saopaulinos, destinos sulinos rebelados
na falsa pretensa periferia dos centralizadores discursos
em dialogo popular com a espontânea sabedoria do sentir
o Anjo mostra os outros gestos gráficos da dicção brasileira
num poema que surge, avança, retoma, escuta, e encara
as semanas e meses, do ano que passa em números e horas,
deixando apenas o minério da experiência, da vivencia, do saber...
João Diniz, 2011